O guia definitivo para escrever cenas de ação convincentes

briga luta lego descrição


Olá, pessoal.

Já tem bastante tempo que vejo pessoas reclamando que não conseguem escrever cenas de ação por estas não ficarem compreensíveis. A cena fica confusa, muito rápida ou arrastada demais, não se consegue descrever os golpes e até há dificuldade de mostrar o resultado delas em termos de hematomas, cortes, fraturas e outras eventuais consequências das lutas.

Escrever cena de ação também é um dos meus pontos fracos, talvez por isso eu sempre pesquise tanto sobre certos aspectos dela. Ao longo desses anos pesquisando e praticando, ainda estou longe de escrever uma cena de ação digna, mas pelo menos aprendi umas coisinhas que podem ser úteis para vocês nessa caminhada.

Claro que isso é apenas um início, umas dicas básicas e simples para que vocês tenham um norte. Pretendo aprofundar alguns subtemas deste post em postagens futuras, então fiquem por perto e let’s go!



# Imagine a cena em detalhes antes de escrever

Esta é uma bola que venho cantando há muito tempo para todas as histórias.

Você não precisa fazer um planejamento (muito menos um mega elaborado) para escrever, mas pelo menos pense na cena e a imagine por completo antes de colocar no papel (ou na tela), ao invés de ir pensando na hora.

Boa parte dos casos de confusão acontece porque insistimos em ir tirando as coisas da cabeça ao longo da escrita. Por não imaginarmos antes onde cada personagem está e o que estão fazendo de fato, corremos o risco de repetir ações e atentar contra a lógica (como eu que, uma vez, escrevi que o personagem estava lutando com uma faca e, do meio pro fim da cena, pareceu tirar do orifício circular corrugado mais uma, porque chegou ao fim com duas facas DO NADA).

Antes de escrever, feche seus bonitos olhinhos e imagine: onde esta cena se passa? Como é esse lugar? Ele pode ser usado ao longo da briga? Quanto dele vou descrever? Quantos personagens estão envolvidos? Eles lutarão com que armas e quantas? Qual o nível de conhecimento deles sobre técnicas de combate físico e de uso das armas disponíveis?

Tudo isso só para um começo e cada pergunta é de fundamental importância para as etapas a seguir.

 

# Pesquise: armas, técnicas de combate, machucados que cada arma causa, etc.

Sobretudo se seu personagem for um especialista (por exemplo: um segurança, militar, policial, ou mesmo um civil altamente treinado, seja para fins legais ou não), é importantíssimo que você conheça manejo de armas (de fogo e brancas) a que ele tem acesso, técnicas de combate físico, direção ofensiva e defensiva (para o caso de ser necessário escrever uma cena de fuga ou perseguição).

Tudo isso apenas para o antes e o durante a cena. Ainda temos o depois.

Obviamente se seu personagem sai por aí fugindo, correndo, cortando, atirando, dirigindo rapidamente meio #aloka por aí, ele vai se machucar ou machucar outras pessoas em algum momento. Por isso é importante você ter noções de como acontecem e se comportam cortes, hematomas, hemorragias, fraturas, contusões e toda a sorte de consequências que seu personagem possa ter (ou causar) em função de seu estilo de vida.

Também faz parte pesquisar sobre primeiros socorros e medidas de contenção. O que já vi de autor colocando personagens para fazer torniquetes em hemorragias, sem saber o risco que estão infligindo neles de necrose de perna ou braço não é brincadeira.

Pretendo desenvolver essa parte futuramente, mas apenas a título de curiosidade, em casos de hemorragia, o mais indicado é fazer compressão sobre o sangramento com um pano limpo, compressa etc., sem garrotear o membro — ou seja, amarrar acima ou abaixo do ferimento.

Tais torniquetes só são indicados em casos de sangramentos arteriais, que podem levar à morte em poucos minutos devido à gravidade e, mesmo assim, é necessário soltar um pouco a pegada de tempos em tempos para que o sangue circule no membro atingido, voltando a apertar pouco depois. A única coisa que seu personagem vai conseguir amarrando uma canela cortada por horas e horas é UMA FUCKING AMPUTAÇÃO! Cuidado.

 

# Cuidado com as descrições

Pensar na cena antes de escrevê-la permite que você imagine com cuidado a ambientação, antevendo como os personagens se movimentarão pelo cenário, o que você vai precisar descrever deles e como o espaço será usado na cena.

Especificamente sobre descrição, não tem coisa mais chata que estar lendo uma cena de ação bem empolgante e o autor parar no meio para descrever o ambiente. Piora quando é para dar detalhes sem importância alguma para o que está acontecendo.

Se você vai colocar seus personagens para brigar em um ambiente que já apareceu antes, o ideal é que você já tenha descrito esse lugar ANTES, portanto o leitor já sabe e não é necessário mostrar tudo de novo, apenas relembrar algumas coisas em geral.

Se é um ambiente novo, o melhor é colocar a descrição apenas do que importa (e antes de a briga começar). A partir do momento em que o pau começar a quebrar, só descreva se for estritamente necessário e lembre que ninguém vai parar de socar a cara do maior desafeto para dizer que o papel de parede da sala era cor de creme com arabescos em dourado importados da Europa com o objetivo de lembrar os donos da casa da imponência e requinte dos palácios da época da monarquia britânica.

No máximo, o personagem vai querer pintar as paredes claras da sala apinhada de móveis velhos, que certamente serão usados como arma em algum momento, com o vermelho do sangue inimigo. Qualquer coisa muito além disso, pode ser considerada supérflua e deletada sem dó na edição.

 

# Menos é mais!

Seja conciso. Se o problema maior das cenas de ação é deixar o resultado confuso, sem que o leitor perceba quem bateu em quem, quem quebrou a perna de quem, quem fugiu de quem e quem perseguiu quem por quilômetros a fio, não complique sua vida.

(Duvido que você não tenha relido essa frase anterior umas duas vezes, aliás. Eu reli.)

Envolver muitos personagens de uma vez e tentar acompanhar todos ao mesmo tempo não ajuda em nada.  Muito menos prolongar suas frases demais ou não atentar à gramática.

Um problema bem comum em escritores de qualquer gênero, principalmente nos iniciantes, é não usar a pontuação a seu favor. Vírgulas e pontos existem por um motivo. Em certos momentos, sai melhor quebrar uma frase grande em outras menores para facilitar o entendimento e até melhorar o ritmo da leitura.

Exemplo prático? Vamos lá. Leia comigo o trecho abaixo:

 

Então puxou seus cabelos para trás forçando a encarar seus olhos e todo seu corpo doía e implorava por descanso, mas ela não vacilaria porque precisava terminar logo que havia começado.

Arrancou a faca, ainda enfiada na mão dela, provocando ainda mais dor e a ergueu para o golpe final mesmo estando ofegante e ignorando ao máximo suas próprias dores para encerrar logo aquilo de vez.

O próprio cansaço trabalhou a seu favor, puxando seu braço para baixo e ajudando-a a enterrar a lâmina no pescoço da rival com tanta violência que o jato do sangue quente e escarlate chegou a sujá-la, misturando-se com o seu próprio.

 

À parte o parcial spoiler de uma história minha (se bem que, do jeito que sou perfeccionista, duvido que vocês ainda se lembrem quando estiver postada de tanto que demoro a achar algo legal o suficiente para poder publicar). Alterei só algumas coisas para que vocês entendam meu ponto.

Não está ruim, mas está um pouco confuso porque temos apenas pronomes (sem os nomes das personagens para saber quem está fazendo o que, exatamente) e as frases muito longas deixam a leitura um pouco travada e cansativa. Assim, é necessário encomendar e distribuir um pequeno carregamento de vírgulas e pontos.

Vamos melhorar parágrafo por parágrafo, vou só atribuir outros nomes às personagens para que vocês não tenham um spoiler tão grande assim (hehe).

 

Então Ana puxou os cabelos de Maria para trás, forçando-a a encarar seus olhos. Todo seu corpo doía e implorava por descanso, mas não vacilaria. Precisava terminar o que começara.

E logo.

Arrancou a faca que permanecia enfiada na mão de Maria até aquele momento, provocando ainda mais dor, e a ergueu para o golpe final. Ofegante, ignorava ao máximo suas próprias dores para encerrar aquilo de vez.

O próprio cansaço trabalhou a seu favor, puxando seu braço para baixo e ajudando-a a enterrar a lâmina no pescoço da rival. Tanta violência fez o jato de sangue quente e escarlate a sujá-la, misturando-se com o seu próprio.

O corpo sem vida de Maria caiu no chão enlameado.

Só então Ana se permitiu desabar. Apoiou as mãos no chão, tentando recuperar o fôlego.

 

Ainda não está perfeito, mas apenas para fins de exemplo, já podemos ter uma breve noção de como as coisas ficam mais claras quando mencionamos nomes aqui e ali e fragmentamos frases muito compridas. Só comparar os dois.

Lembre-se: texto ficcional não é textão do ENEM. Não faça seu leitor chegar ao final da frase e não lembrar mais do que estava no começo; ou isso pode ser a morte de sua história. Dizer com 10 palavras o que antes estava escrito com 50 é a chave.

Como é possível? Participe de uns dois desafios de drabbles do Nyah até o fim e volte aqui depois. Sua cabeça vai estar totalmente diferente: cada palavra deve contar, então evite usar duas ou três palavras quando uma vai passar a mesma coisa de forma mais direta e com mais impacto.

 

# Pratique!

Como toda cena mais complicada, é fundamental que você escreva muitas cenas do tipo com diferentes variações.

Cenas de ação em lugares abertos e fechados; com duas pessoas, pequenos grupos e exércitos inteiros; personagem saindo na mão, usando o cenário como arma, lâminas, tiro e bomba; em trincheira, parede de escudo, fazendo barricada; de dia, de noite, com sol, com chuva, em temperaturas extremas; em locais que conhece ou não; na terra, no ar, na água, no subsolo... O leque é infinito.

Identifique que estilo de cena você vai ter mais dificuldade para poder praticá-la ainda mais do que as outras (eu mesma sou até razoável escrevendo brigas entre duas pessoas, mas me coloca para descrever uma batalha épica entre exércitos grandes que eu travo por completo).

Não espere que vá ficar perfeito logo de cara, óbvio que não vai. Mas desanimar não é uma opção. Quanto mais difícil a cena, mais você precisa pesquisar, praticar e estudar sobre.

 

# Leia histórias com cenas de ação variadas

Ainda na linha do tópico anterior, é importante que você procure histórias com cenas de ação bem escritas do estilo que você quer escrever para buscar inspiração e ver como é feito.

Aqui é importante perceber que: ver filmes e séries com cenas de ação é importante para que a gente consiga imaginar a cena, ter referência visual. Mas para saber como pegar a imagem que está em nossa cabeça e colocar no papel, não tem jeito. É preciso ler, e ler muito.

Esse é outro grande problema em nossa escrita, ainda lemos muito pouco ao passo em que temos muitas referências visuais. A consequência é que imaginamos cenas de luta maravilhosas que ficam altamente meia-boca no papel porque vemos as imagens, mas não acompanhamos cenas escritas igualmente incríveis.

Leia. Leia bastante. E quando achar que já leu o suficiente, desconfie de si mesmo e leia mais um pouco. Fortaleça seu imaginário e afie suas palavras, oras.

 

# Releia suas cenas até que elas estejam de fácil compreensão

Muita gente acha que, ao terminar de escrever, já está tudo pronto, bonitinho e pode postar.

NÃO!

Guarde seu texto por alguns dias e volte para reler. Com a cabeça fria, poderemos perceber os erros, os pontos nebulosos, o que ainda precisa ser melhorado. A partir daí, vamos trabalhando para corrigir ao longo do processo de revisão (e digo processo porque é algo com várias etapas, e não se engane: a cada uma, vamos percebendo erros novos para consertar #sadbuttrue).

Ao terminar cenas espinhosas, especialmente as que você tem mais dificuldade, guarde-as com mais carinho ainda para relê-las com toda a atenção depois. Enquanto não sentir que a cena está limpa e de fácil compreensão, continue trabalhando nela...

 

# Peça a um amigo para ler a cena e opinar a respeito

...Mas não faça isso sozinho.

Nossa capacidade de perceber nossos próprios defeitos é limitada e precisamos que outros olhos, especialmente desacostumados com o que escrevemos e sem saber muita coisa sobre a história além do que está escrito, possam nos contar o que ainda precisa ser corrigido.

Não precisa ter medo de fazer isso, mas é importante que:

a) Seja alguém em quem você confie, para evitar perigos como plágio (eu mesma fico em pânico com vocês mandando suas histórias para todo mundo que se prontifique a ler em grupos de escritores; só não falo nada nos tópicos para não ser “a tia chata”); e

b) Você esteja preparado para críticas, pois elas podem vir. Se você pede que alguém faça apontamentos sabendo que algo negativo pode vir e fica bravo quando isso acontece, é bem tenso.

Encontrando um amigo ou bom beta que você confie e possa dar opiniões de qualidade sobre o seu trabalho, trabalhem juntos para aparar arestas e polir seu texto. Peça sugestões e dicas, caso seja o autor, e ofereça sempre opiniões embasadas e aponte caminhos, caso seja o beta.

 

 

Bom, foi isso. Claro que são apenas algumas dicas básicas e uma segunda parte pode ser necessária no futuro, mas aqui já dá para ter um guia. Espero que vocês escrevam cenas de ação excelentes no futuro depois dele e se motivem a continuarem estudando e pesquisando.

Até porque vou escrever uma fantasia clássica em breve e vou precisar de bons referenciais. Conto com vocês (hahaha).

Beijos e até o próximo post :*

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2 Comentários

  1. Eu gosto muito da "menos é mais", um tanto por preguiça, porém por ela ser satisfatória na maioria dos casos. Talvez apenas o início da cena precise ser mais detalhada, mas depois é só jogar alguns elementos que o leitor preenche as lacunas rapidamente e até melhor do que se fosse detalhado passo a passo (lógico que existem diferentes formas de obter um bom resultado).

    Não é relacionado com o post, mas dei de cara com um grupo no telegram com a masterclass completa do Neil Gaiman sobre escrita. Para quem sem interessar, segue o link: https://t.me/neil_gaiman_masterclass

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